Assédio Moral - Uma breve análise sobre o conceito, classificação e tratamento no ordenamento jurídico brasileiro
Dr. Cristiano Brandão Gonçalves
Introdução
O assédio moral nas relações laborais é um tema que se demonstra atual, pois vem aumentando no meio corporativo, devido à grande competitividade entre as empresas, o que faz com que estas exijam de seus funcionários o cumprimento de metas muitas vezes intangíveis e para isso usam de métodos intimidatórios e muitas vezes humilhantes.
Porém deve-se lembrar que apesar da atualidade do tema, este não surgiu há pouco tempo, pelo contrário no ambiente laboral sempre existiram casos de pessoas que sofriam assédio moral, porém o ordenamento jurídico não tinha ainda dado ao tema a devida importância.
Hoje apesar de não haver leis específicas sobre o tema, é pacífico em toda a doutrina e jurisprudência a existência do assédio moral, bem como dos danos que esta pode causar, tanto de cunho psicológico, quanto moral, causando transtornos tão grandes que podem levar as vítimas até ao suicídio.
1. Conceito
O assédio moral é uma humilhação sofrida por alguém, podendo acontecer nos mais diversos segmentos da sociedade, e em suas instituições, na maior parte das vezes por superiores hierárquicos, que por condutas não isoladas humilham a vítima. Apresenta-se no âmbito familiar, no caso dos pais que humilham os filhos, ou do cônjuge que assedia o outro, bem como no escolar, nesse caso sendo mais comum o assédio entre professor aluno, mas podendo ser encontrado também entre alunos, este que culturalmente é mais aceito, e tratado como atitude natural, por muitos.
Frisamos que, o assédio moral para ser configurado não precisa gerar danos não reparáveis, ou algum tipo de seqüela e sim podendo simplesmente ser configurado quando uma pessoa através de suas condutas atinge a dignidade subjetiva da vítima.
A dignidade subjetiva é aquela que atinge a honra da pessoa. Sendo que se uma pessoa é, por exemplo, chamada por um apelido e por isso se sente constrangida tem sua dignidade subjetiva afetada. Neste caso teria sua dignidade objetiva atingida se no ambiente onde ele trabalha as pessoas tomassem conhecimento e passassem a vê-lo de maneira menos respeitosa, ou a repetir o apelido, virando ele motivo de piadas, ou seja, seria esta dignidade em relação a suas relações interpessoais com os demais, enquanto seria a outra em relação a sua honra pessoal, não dependendo esta última do conhecimento de terceiras pessoas.
Entretanto importa-nos a agressão sofrida nas relações de trabalho. Esta advém ao longo do tempo acobertada por permissibilidades da sociedade, que por muitas vezes, e em diversos países, encara esse tema com certo descaso, sendo que esse tipo de tratamento hostil é quase que comum em seu cotidiano.
Segundo conceitua Paulo Perli:
"O assédio moral se caracteriza pela atitude insistente e pela ação reiterada, por período prolongado, com ataques repetidos, que submetem a vítima a situações de humilhação, de rejeição, vexatórias, discriminatórias e constrangedoras com o objetivo de desestabilizá-la emocional e psiquicamente, quase sempre com severos reflexos na saúde física e mental." (2006, p.27)
O tema é tratado pelo ordenamento jurídico de maneira nova, sendo que ainda muitos casos não são levados à frente por medo de represálias, ou por ser o agressor um superior que se denunciado pode fazer com que a pessoa perca o emprego, ou porque este já tem certo domínio psíquico sobre o assediado imputando a vítima certo temor.
Esta agressão viola claramente o princípio da dignidade da pessoa humana, garantia que é dada a todos por nossa Carta Magna, e que seria a base de todos outros tantos direitos inerentes ao indivíduo em uma sociedade organizada.
Segundo a professora Marie - France Hirigoyen, o assédio moral, ou também chamada agressão psicológica, se concretiza em uma “invasão progressiva no território psíquico de outro”. (2001, p.12)
Como nos lembra a professora Maria Aparecida Alkimin, é um tema de suma relevância uma vez que, “essa prática contamina o ambiente de trabalho, violando a garantia constitucional de um meio de ambiente sadio e equilibrado”. (2005, p.36)
Tal atitude além de prejudicar a vítima pode também prejudicar o meio corporativo, a empresa como um todo, vez que um ambiente de trabalho sadio tende a produzir, pela lógica, melhores resultados, pois os trabalhadores se sentem mais bem realizados para desempenhar suas funções.
Sobre os danos causados, lembra José Osmir Fiorelli, que quando emitidos, os comportamentos passíveis de caracterização como assédio moral por uma ou mais pessoas, já é possível que traga mal-estar, e diversos prejuízos para uma pessoa ou um grupo. (2007, p.32)
O site http://www.assediomoral.org/spip.php?article1 conceitua:
"É a exposição dos trabalhadores e trabalhadoras a situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções, sendo mais comuns em relações hierárquicas autoritárias e assimétricas, em que predominam condutas negativas, relações desumanas e aéticas de longa duração, de um ou mais chefes dirigida a um ou mais subordinado(s), desestabilizando a relação da vítima com o ambiente de trabalho e a organização, forçando-o a desistir do emprego”. (Acesso dia 26/11/08)
Ainda Hirigoyen conceitua assédio moral como sendo:
"qualquer conduta abusiva ( gesto, palavra, comportamento, atitude) que atente por sua repetição ou sistematização, contra a dignidade ou integridade psíquica ou física de uma pessoa, ameaçando seu emprego ou degradando o ambiente de trabalho”. (2002, p.17)
Lembra-nos também, Hirogoyen, que as vítimas necessariamente “não são pessoas portadoras de qualquer patologia, ou particularmente frágeis” (2005, p.68). Um bom exemplo desse caso, é o fato de que no assédio moral vertical descendente, que será melhor estudado adiante, o assediado, logo vítima, é o empregador.
Cláudio Vianna Lima apud por Roberta Mota Pereira da Silva (2005, p.39), ressalta que inicialmente, pode-se dizer que:
"(...) os principais alvos do assédio moral são os empregados estáveis, como diretores de sindicato e funcionários públicos, pois a estabilidade impede que os mesmos sejam dispensados sem justa causa, de modo que a tática utilizada por muitas vezes pelos administradores é a de vencer pelo cansaço.
(...) os trabalhadores vítimas de acidentes de trabalho, ou de qualquer doença, pois, ao invés de readaptá-los de modo paciente e compreensivo, empregador e colegas preferem hostilizá-lo, zombando de sua situação e criando ambiente totalmente desagradável ao reabilitado."
Como demonstrado o assédio moral pode ser um meio eficaz de humilhar pessoas que por sua condição se encontram em uma posição diferenciada, sendo por inabilitações temporárias a determinadas funções, seja por gozar de prerrogativas por estar em cargos que visam proteger o empregado. É claro o objetivo de desestimular o empregado.
Importante dizer que esse não é um rol taxativo e meramente exemplificativo, pois o agressor pode se valer de formas diferentes e mesmo assim ser caracterizado o assédio moral.
Tratado do conceito de que assédio moral é uma recorrente humilhação, podendo ser ou não, feita por um superior hierárquico, para nós importando nas relações de trabalho, faz-se necessário agora à classificação do tema, que será feita no próximo sub-ítem.
2. Classificação
Há segundo a doutrina três espécies de assédio moral, são eles :
A – Assédio moral vertical descendente – é aquele segundo o qual um subordinado é agredido por um superior.
È o tipo de assédio em que o empregador, bem como qualquer outro superior hierárquico ( diretor, gerente, assessor, chefe, supervisor, etc.) que receba a delegação ou o poder. (ALKIMIN, 2005, p.61)
Pode ser simplesmente um caso de abuso de poder: um superior se prevalece de sua posição hierárquica perseguindo seus subordinados por medo de perder o controle.(HIRIGOYEN, 2002,P.112)
Roberta Silva explana ainda sobre a motivação desse abuso dizendo que este “pode ser também uma manobra perversa de um indivíduo que, para engrandecer-se, sente necessidade de rebaixar os demais; ou que tem necessidade, para existir, de destruir um determinado indivíduo escolhido como bode expiatório.” (2005, p.40).
Esse abuso é claramente ilegal e imoral, visto que este abuso caracteriza um constrangimento ilegal, mostrando ser o agressor um covarde que se não se fizesse valer de seu cargo com certeza não constrangeria a vítima. Por vezes isso ocorre pela inveja, por vezes pelo simples fato sádico de gostar de perseguir alguém e por vezes para querer se exaltar a medida que diminui todos os outros.
É o caso mais freqüente no contexto atual, segundo Hirigoyen, que diz “que se busca fazer crer que aos assalariados que eles têm que estar dispostos a aceitar tudo se quiserem manter o emprego. ( 2005, p.75)
B - Assédio moral horizontal – é aquele praticado entre pessoas de mesma hierarquia.
Conceitua ALKIMIN:
“Trata-se de assédio moral cometido por colega de serviço, manifesta-se através de brincadeiras maldosas, gracejo, menosprezo, piadas, grosserias, gestos obscenos, isolamento, etc.”
Esse assédio está ligado de maneira geral a dois casos a competitividade e/ou rivalidade e a conflitos interpessoais. (ALKIMIN, 2008, p.64)
A competitividade vem em decorrência de disputa de um mesmo cargo ou promoção, já o de relacionamento interpessoal por relacionamentos mal-sucedidos, ou antipatia devida a alguma situação, ou muitas vezes inveja.
Esse é um assédio muitas vezes difícil de ser combatido, pois, o empregador quando comunicado ou não se envolve por não querer favorecer um ou outro, correndo o risco de ser injusto, ou por achar que isso não lhe cabe. Muitas vezes a vítima torna-se alvo de piadas por ter procurado uma terceira pessoa, no caso o empregador, para solucionar este problema.
C – Assédio moral vertical ascendente – praticado pelo empregado contra o empregador.
Fato dentre os três de mais difícil constatação, por ser o empregado o hipossuficiente da relação empregatícia, já que necessita do salário, e geralmente não conta com a assistência jurídica nem com poder aquisitivo melhor que o do empregador.
Segundo Hirigoyen, acontece, em grande parte das vezes quando o superior é alguém de fora e que tenha seus métodos reprovados, ou ainda, quando este é antigo colega de seus novos subordinados.
(HIRIGOYEN, 2005, p.74)
Sugere a professora Alkimin, que o este tipo de assédio moral acontece devido a um aspecto pontual na personalidade da vítima, que de maneira incomum é neste caso o empregador. Traz a doutrinadora:
Pode ser ainda por insegurança ou inexperiência, o superior hierárquico não consiga manter o domínio sobre os trabalhadores, sendo desrespeitado, implicando o fortalecimento dos assediadores para se livrar do superior indesejado (ALKIMIN, 2008, p.65)
Passaremos no próximo sub-ítem a uma análise de um breve histórico, frisando o porque tal legislação surgiu no mundo.
3. Histórico
Pode-se dizer que a prática do assédio moral não é recente. Porém somente nessa última década é que vem sendo estudado. Os grandes pesquisadores do tema, citados por todos os autores que escrevem sobre o tema são o psicólogo sueco Leyman, seguido pelo brilhante trabalho da também psicóloga Marie - France Hirigoyen.
A partir dos estudos dos supramencionados autores é que começaram as pesquisas dos aspectos jurídicos do assédio moral, pois os estudiosos do direito passaram a ver a importância e a recorrência do tema.
Segundo Fiorelli por meio dos estudos e pesquisas é que governos, sindicatos e trabalhadores se conscientizaram a respeito de sua existência e conseqüências, e o resultado disso tem sido o surgimento de legislações referentes ao tema, notoriamente em outros países.( FIORELLI, 2007, p.32)
Segundo Hádassa Ferreira ”(...) o assédio moral analisado como sofrimento no ambiente de trabalho é fenômeno que nasce no bojo da globalização e das políticas neoliberais inauguradas conjuntamente” (FERREIRA, 2004,p. 36)
O assédio moral, identificado por Leyman, em 1980 tem suas origens no chamado ”mobbing”, que vem do verbo inglês “to mob”, a palavra significa ações como assaltar, agredir em massa, humilhar, derivado do substantivo “mob” que por sua vez significa multidão em tumulto, quantidades de pessoas desordenadas, logo, a expressão” mobbing” está associada à forma de violência coletiva, ligada à organização do trabalho. (ALKIMIN, 2008, p.38-39)
4. Tratamento jurídico no direito brasileiro
Traz nossa Constituição uma especificação, primeiramente em seus princípios trazendo, que o princípio da dignidade da pessoa humana, em seu artigo 1° inciso III, é um dos fundamentos aos quais se rege a República Federativa do Brasil.
Ainda em nossa Carta Magna agora em seu art.3°, inciso IV, versa que um dos objetivos do Estado, é “promover o bem de todos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.
Penalmente o assédio moral não é tipificado como conduta ilícita, sendo necessário para ser punido a prática de um outro delito a partir da conduta do agressor.
A CLT em dois momentos traz a proteção contra o assédio no seu artigo 483, que gera ao empregado o direito de pedir rescisão indireta em caso de assédio vertical e no seu art.482 ao garantir o direito à justa causa; ou direito à indenização no caso de dano. (SILVA, 2005, p.38)
No campo cível, todo aquele que causar dano a outrem, através de ato ilícito, tem o dever de repará-lo. Por sua vez configura-se ato ilícito como sendo ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, que violar direito e causar dano, ainda que exclusivamente moral. (Código Civil de 2002)
Pautado na legislação supra mencionada, pode-se dizer que não é necessário que se comprove a existência de um dano material, nem mesmo psicológico, tão somente sendo necessário ser comprovado o dano moral e o nexo causal deste com o assédio.
5. Dos casos passíveis de indenização
O assédio moral como já outrora definido neste trabalho é humilhar alguém, por reiteradas vezes causando-lhe dano ainda que meramente moral.
Porém para ser caracterizado o dano moral deve-se analisar os elementos que permitem a responsabilização civil, são eles: a prática de um ato ilícito, a culpa, o nexo causal e o dano.
Comecemos então pela analise da prática do assédio moral ser considerado um ilícito civil. O Código Civil de 2002, ora vigente, traz a baila essa conceituação de ilícito civil no seu artigo 186, dizendo que este se conceitua como “ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, que viola direito e causa danos a outrem, ainda que exclusivamente moral”. Como se pode ver o assédio moral se enquadra perfeitamente na descrição do artigo por ser uma ação, frise-se reiterada, que viola o direito ao bem jurídico dignidade e causa danos por vezes irreversíveis, sendo geralmente de cunho moral.
A culpa está presente por ter o sujeito praticado uma ação na qual resultou o dano, nesse caso há de se lembrar a conceituação trazida no capítulo anterior, podendo ser a culpa parcialmente da vítima, ou culpa do agente. A culpa pode ser parcialmente da vítima por ter esta o costume de satirizar os colegas imputando-lhes apelidos, dando a oportunidade para que os outros assim também o façam. A nosso ver no estudo em tela não há de se falar em culpa exclusiva da vítima, porque ninguém faz com que se pratique contra si ato de humilhação passível de ser configurado como assédio moral.
Como em todos os casos de responsabilidade civil o nexo causal deve estar presente, ou seja, o dano causado à vítima do assédio moral de ter um liame de causalidade com a atitude do agente.
O dano pode ser ocasionado tanto no âmbito material como no moral. O dano material se deve ao tratamento de possíveis psicopatologias auferidas no tempo em que o assédio era praticado. Já o dano moral é decorrente puramente da humilhação que atinge a honra objetiva ou subjetiva da vítima, sendo a primeira quando terceiras pessoas presenciam ou tomam conhecimento do ocorrido, fazendo com que a reputação pessoal ou profissional da vítima seja maculada, ou na segunda hipótese quando a pessoa se sente intimamente ofendida, porém sem o conhecimento de terceiros, mantendo uma imagem, ante terceiros, imaculada.
5.1. Da fixação do 'quantum'
O artigo 946 do Código Civil reza que:
“Se a obrigação for indeterminada, e não houver na lei, ou contrato fixando a indenização devida pelo inadimplente, apurar-se-á o valor das perdas e danos na forma que a lei processual determinar”.
Deve-se analisar, no dano material, para que não haja injustiças no valor da indenização não somente o que o indivíduo perdeu, mas também pelo que ele deixou de ganhar.
Sobre isso traz o artigo 402 que:
“Salvo as exceções previstas em lei as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar”.
Feita esta análise outro conceito deve ser trazido à baila, é que, danos patrimoniais segundo Venosa são aquelas que “são suscetíveis de avaliação pecuniária, podendo ser reparado por reposição de dinheiro, denominador comum da indenização” (VENOSA, 2006, p.32)
Nas palavras de Wilson Melo de Silva apud Silvio Rodrigues danos morais são:
lesões sofridas pelo sujeito físico ou pessoa natural de direito em seu patrimônio ideal, entendendo-se por patrimônio ideal, em contraposição a patrimônio material, o conjunto de tudo aquilo que não seja suscetível de valor econômico(RODRIGUES, 2002, P. 189)
Como nos lembra Carlos Roberto Gonçalves, “o problema da quantificação do dano moral tem preocupado o mundo jurídico, em virtude da proliferação de demandas, sem que existam parâmetros seguros para sua quantificação”.(GONÇALVES, 2003, p.569)
Porque o que se mede no dano moral, é o dano psicológico ocorrido, a dor sofrida, coisas imensuráveis.
Então observando o disposto no supracitado artigo 946 do Código Civil, cabe ao juiz, sem nenhum parâmetro pré-fixado, quantificar o valor da indenização.
Concluímos que cada caso deve ser analisado individualmente, não podendo haver uma fórmula ou um valor máximo para sua fixação porque dependendo de quanto a dignidade da pessoa foi atingida é que se poderá mensurar um valor para indenização.
Fonte: http://preparabrasil.uol.com.br/_site/artigos/artigo_default.asp?ID=1973
Dr. Cristiano Brandão Gonçalves
Introdução
O assédio moral nas relações laborais é um tema que se demonstra atual, pois vem aumentando no meio corporativo, devido à grande competitividade entre as empresas, o que faz com que estas exijam de seus funcionários o cumprimento de metas muitas vezes intangíveis e para isso usam de métodos intimidatórios e muitas vezes humilhantes.
Porém deve-se lembrar que apesar da atualidade do tema, este não surgiu há pouco tempo, pelo contrário no ambiente laboral sempre existiram casos de pessoas que sofriam assédio moral, porém o ordenamento jurídico não tinha ainda dado ao tema a devida importância.
Hoje apesar de não haver leis específicas sobre o tema, é pacífico em toda a doutrina e jurisprudência a existência do assédio moral, bem como dos danos que esta pode causar, tanto de cunho psicológico, quanto moral, causando transtornos tão grandes que podem levar as vítimas até ao suicídio.
O assédio moral é uma humilhação sofrida por alguém, podendo acontecer nos mais diversos segmentos da sociedade, e em suas instituições, na maior parte das vezes por superiores hierárquicos, que por condutas não isoladas humilham a vítima. Apresenta-se no âmbito familiar, no caso dos pais que humilham os filhos, ou do cônjuge que assedia o outro, bem como no escolar, nesse caso sendo mais comum o assédio entre professor aluno, mas podendo ser encontrado também entre alunos, este que culturalmente é mais aceito, e tratado como atitude natural, por muitos.
Frisamos que, o assédio moral para ser configurado não precisa gerar danos não reparáveis, ou algum tipo de seqüela e sim podendo simplesmente ser configurado quando uma pessoa através de suas condutas atinge a dignidade subjetiva da vítima.
A dignidade subjetiva é aquela que atinge a honra da pessoa. Sendo que se uma pessoa é, por exemplo, chamada por um apelido e por isso se sente constrangida tem sua dignidade subjetiva afetada. Neste caso teria sua dignidade objetiva atingida se no ambiente onde ele trabalha as pessoas tomassem conhecimento e passassem a vê-lo de maneira menos respeitosa, ou a repetir o apelido, virando ele motivo de piadas, ou seja, seria esta dignidade em relação a suas relações interpessoais com os demais, enquanto seria a outra em relação a sua honra pessoal, não dependendo esta última do conhecimento de terceiras pessoas.
Entretanto importa-nos a agressão sofrida nas relações de trabalho. Esta advém ao longo do tempo acobertada por permissibilidades da sociedade, que por muitas vezes, e em diversos países, encara esse tema com certo descaso, sendo que esse tipo de tratamento hostil é quase que comum em seu cotidiano.
Segundo conceitua Paulo Perli:
"O assédio moral se caracteriza pela atitude insistente e pela ação reiterada, por período prolongado, com ataques repetidos, que submetem a vítima a situações de humilhação, de rejeição, vexatórias, discriminatórias e constrangedoras com o objetivo de desestabilizá-la emocional e psiquicamente, quase sempre com severos reflexos na saúde física e mental." (2006, p.27)
O tema é tratado pelo ordenamento jurídico de maneira nova, sendo que ainda muitos casos não são levados à frente por medo de represálias, ou por ser o agressor um superior que se denunciado pode fazer com que a pessoa perca o emprego, ou porque este já tem certo domínio psíquico sobre o assediado imputando a vítima certo temor.
Esta agressão viola claramente o princípio da dignidade da pessoa humana, garantia que é dada a todos por nossa Carta Magna, e que seria a base de todos outros tantos direitos inerentes ao indivíduo em uma sociedade organizada.
Segundo a professora Marie - France Hirigoyen, o assédio moral, ou também chamada agressão psicológica, se concretiza em uma “invasão progressiva no território psíquico de outro”. (2001, p.12)
Como nos lembra a professora Maria Aparecida Alkimin, é um tema de suma relevância uma vez que, “essa prática contamina o ambiente de trabalho, violando a garantia constitucional de um meio de ambiente sadio e equilibrado”. (2005, p.36)
Tal atitude além de prejudicar a vítima pode também prejudicar o meio corporativo, a empresa como um todo, vez que um ambiente de trabalho sadio tende a produzir, pela lógica, melhores resultados, pois os trabalhadores se sentem mais bem realizados para desempenhar suas funções.
Sobre os danos causados, lembra José Osmir Fiorelli, que quando emitidos, os comportamentos passíveis de caracterização como assédio moral por uma ou mais pessoas, já é possível que traga mal-estar, e diversos prejuízos para uma pessoa ou um grupo. (2007, p.32)
O site http://www.assediomoral.org/spip.php?article1 conceitua:
"É a exposição dos trabalhadores e trabalhadoras a situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções, sendo mais comuns em relações hierárquicas autoritárias e assimétricas, em que predominam condutas negativas, relações desumanas e aéticas de longa duração, de um ou mais chefes dirigida a um ou mais subordinado(s), desestabilizando a relação da vítima com o ambiente de trabalho e a organização, forçando-o a desistir do emprego”. (Acesso dia 26/11/08)
Ainda Hirigoyen conceitua assédio moral como sendo:
"qualquer conduta abusiva ( gesto, palavra, comportamento, atitude) que atente por sua repetição ou sistematização, contra a dignidade ou integridade psíquica ou física de uma pessoa, ameaçando seu emprego ou degradando o ambiente de trabalho”. (2002, p.17)
Lembra-nos também, Hirogoyen, que as vítimas necessariamente “não são pessoas portadoras de qualquer patologia, ou particularmente frágeis” (2005, p.68). Um bom exemplo desse caso, é o fato de que no assédio moral vertical descendente, que será melhor estudado adiante, o assediado, logo vítima, é o empregador.
Cláudio Vianna Lima apud por Roberta Mota Pereira da Silva (2005, p.39), ressalta que inicialmente, pode-se dizer que:
"(...) os principais alvos do assédio moral são os empregados estáveis, como diretores de sindicato e funcionários públicos, pois a estabilidade impede que os mesmos sejam dispensados sem justa causa, de modo que a tática utilizada por muitas vezes pelos administradores é a de vencer pelo cansaço.
(...) os trabalhadores vítimas de acidentes de trabalho, ou de qualquer doença, pois, ao invés de readaptá-los de modo paciente e compreensivo, empregador e colegas preferem hostilizá-lo, zombando de sua situação e criando ambiente totalmente desagradável ao reabilitado."
Como demonstrado o assédio moral pode ser um meio eficaz de humilhar pessoas que por sua condição se encontram em uma posição diferenciada, sendo por inabilitações temporárias a determinadas funções, seja por gozar de prerrogativas por estar em cargos que visam proteger o empregado. É claro o objetivo de desestimular o empregado.
Importante dizer que esse não é um rol taxativo e meramente exemplificativo, pois o agressor pode se valer de formas diferentes e mesmo assim ser caracterizado o assédio moral.
Tratado do conceito de que assédio moral é uma recorrente humilhação, podendo ser ou não, feita por um superior hierárquico, para nós importando nas relações de trabalho, faz-se necessário agora à classificação do tema, que será feita no próximo sub-ítem.
2. Classificação
Há segundo a doutrina três espécies de assédio moral, são eles :
A – Assédio moral vertical descendente – é aquele segundo o qual um subordinado é agredido por um superior.
È o tipo de assédio em que o empregador, bem como qualquer outro superior hierárquico ( diretor, gerente, assessor, chefe, supervisor, etc.) que receba a delegação ou o poder. (ALKIMIN, 2005, p.61)
Pode ser simplesmente um caso de abuso de poder: um superior se prevalece de sua posição hierárquica perseguindo seus subordinados por medo de perder o controle.(HIRIGOYEN, 2002,P.112)
Roberta Silva explana ainda sobre a motivação desse abuso dizendo que este “pode ser também uma manobra perversa de um indivíduo que, para engrandecer-se, sente necessidade de rebaixar os demais; ou que tem necessidade, para existir, de destruir um determinado indivíduo escolhido como bode expiatório.” (2005, p.40).
Esse abuso é claramente ilegal e imoral, visto que este abuso caracteriza um constrangimento ilegal, mostrando ser o agressor um covarde que se não se fizesse valer de seu cargo com certeza não constrangeria a vítima. Por vezes isso ocorre pela inveja, por vezes pelo simples fato sádico de gostar de perseguir alguém e por vezes para querer se exaltar a medida que diminui todos os outros.
É o caso mais freqüente no contexto atual, segundo Hirigoyen, que diz “que se busca fazer crer que aos assalariados que eles têm que estar dispostos a aceitar tudo se quiserem manter o emprego. ( 2005, p.75)
B - Assédio moral horizontal – é aquele praticado entre pessoas de mesma hierarquia.
Conceitua ALKIMIN:
“Trata-se de assédio moral cometido por colega de serviço, manifesta-se através de brincadeiras maldosas, gracejo, menosprezo, piadas, grosserias, gestos obscenos, isolamento, etc.”
Esse assédio está ligado de maneira geral a dois casos a competitividade e/ou rivalidade e a conflitos interpessoais. (ALKIMIN, 2008, p.64)
A competitividade vem em decorrência de disputa de um mesmo cargo ou promoção, já o de relacionamento interpessoal por relacionamentos mal-sucedidos, ou antipatia devida a alguma situação, ou muitas vezes inveja.
Esse é um assédio muitas vezes difícil de ser combatido, pois, o empregador quando comunicado ou não se envolve por não querer favorecer um ou outro, correndo o risco de ser injusto, ou por achar que isso não lhe cabe. Muitas vezes a vítima torna-se alvo de piadas por ter procurado uma terceira pessoa, no caso o empregador, para solucionar este problema.
C – Assédio moral vertical ascendente – praticado pelo empregado contra o empregador.
Fato dentre os três de mais difícil constatação, por ser o empregado o hipossuficiente da relação empregatícia, já que necessita do salário, e geralmente não conta com a assistência jurídica nem com poder aquisitivo melhor que o do empregador.
Segundo Hirigoyen, acontece, em grande parte das vezes quando o superior é alguém de fora e que tenha seus métodos reprovados, ou ainda, quando este é antigo colega de seus novos subordinados.
(HIRIGOYEN, 2005, p.74)
Sugere a professora Alkimin, que o este tipo de assédio moral acontece devido a um aspecto pontual na personalidade da vítima, que de maneira incomum é neste caso o empregador. Traz a doutrinadora:
Pode ser ainda por insegurança ou inexperiência, o superior hierárquico não consiga manter o domínio sobre os trabalhadores, sendo desrespeitado, implicando o fortalecimento dos assediadores para se livrar do superior indesejado (ALKIMIN, 2008, p.65)
Passaremos no próximo sub-ítem a uma análise de um breve histórico, frisando o porque tal legislação surgiu no mundo.
3. Histórico
Pode-se dizer que a prática do assédio moral não é recente. Porém somente nessa última década é que vem sendo estudado. Os grandes pesquisadores do tema, citados por todos os autores que escrevem sobre o tema são o psicólogo sueco Leyman, seguido pelo brilhante trabalho da também psicóloga Marie - France Hirigoyen.
A partir dos estudos dos supramencionados autores é que começaram as pesquisas dos aspectos jurídicos do assédio moral, pois os estudiosos do direito passaram a ver a importância e a recorrência do tema.
Segundo Fiorelli por meio dos estudos e pesquisas é que governos, sindicatos e trabalhadores se conscientizaram a respeito de sua existência e conseqüências, e o resultado disso tem sido o surgimento de legislações referentes ao tema, notoriamente em outros países.( FIORELLI, 2007, p.32)
Segundo Hádassa Ferreira ”(...) o assédio moral analisado como sofrimento no ambiente de trabalho é fenômeno que nasce no bojo da globalização e das políticas neoliberais inauguradas conjuntamente” (FERREIRA, 2004,p. 36)
O assédio moral, identificado por Leyman, em 1980 tem suas origens no chamado ”mobbing”, que vem do verbo inglês “to mob”, a palavra significa ações como assaltar, agredir em massa, humilhar, derivado do substantivo “mob” que por sua vez significa multidão em tumulto, quantidades de pessoas desordenadas, logo, a expressão” mobbing” está associada à forma de violência coletiva, ligada à organização do trabalho. (ALKIMIN, 2008, p.38-39)
4. Tratamento jurídico no direito brasileiro
Traz nossa Constituição uma especificação, primeiramente em seus princípios trazendo, que o princípio da dignidade da pessoa humana, em seu artigo 1° inciso III, é um dos fundamentos aos quais se rege a República Federativa do Brasil.
Ainda em nossa Carta Magna agora em seu art.3°, inciso IV, versa que um dos objetivos do Estado, é “promover o bem de todos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.
Penalmente o assédio moral não é tipificado como conduta ilícita, sendo necessário para ser punido a prática de um outro delito a partir da conduta do agressor.
A CLT em dois momentos traz a proteção contra o assédio no seu artigo 483, que gera ao empregado o direito de pedir rescisão indireta em caso de assédio vertical e no seu art.482 ao garantir o direito à justa causa; ou direito à indenização no caso de dano. (SILVA, 2005, p.38)
No campo cível, todo aquele que causar dano a outrem, através de ato ilícito, tem o dever de repará-lo. Por sua vez configura-se ato ilícito como sendo ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, que violar direito e causar dano, ainda que exclusivamente moral. (Código Civil de 2002)
Pautado na legislação supra mencionada, pode-se dizer que não é necessário que se comprove a existência de um dano material, nem mesmo psicológico, tão somente sendo necessário ser comprovado o dano moral e o nexo causal deste com o assédio.
5. Dos casos passíveis de indenização
O assédio moral como já outrora definido neste trabalho é humilhar alguém, por reiteradas vezes causando-lhe dano ainda que meramente moral.
Porém para ser caracterizado o dano moral deve-se analisar os elementos que permitem a responsabilização civil, são eles: a prática de um ato ilícito, a culpa, o nexo causal e o dano.
Comecemos então pela analise da prática do assédio moral ser considerado um ilícito civil. O Código Civil de 2002, ora vigente, traz a baila essa conceituação de ilícito civil no seu artigo 186, dizendo que este se conceitua como “ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, que viola direito e causa danos a outrem, ainda que exclusivamente moral”. Como se pode ver o assédio moral se enquadra perfeitamente na descrição do artigo por ser uma ação, frise-se reiterada, que viola o direito ao bem jurídico dignidade e causa danos por vezes irreversíveis, sendo geralmente de cunho moral.
A culpa está presente por ter o sujeito praticado uma ação na qual resultou o dano, nesse caso há de se lembrar a conceituação trazida no capítulo anterior, podendo ser a culpa parcialmente da vítima, ou culpa do agente. A culpa pode ser parcialmente da vítima por ter esta o costume de satirizar os colegas imputando-lhes apelidos, dando a oportunidade para que os outros assim também o façam. A nosso ver no estudo em tela não há de se falar em culpa exclusiva da vítima, porque ninguém faz com que se pratique contra si ato de humilhação passível de ser configurado como assédio moral.
Como em todos os casos de responsabilidade civil o nexo causal deve estar presente, ou seja, o dano causado à vítima do assédio moral de ter um liame de causalidade com a atitude do agente.
O dano pode ser ocasionado tanto no âmbito material como no moral. O dano material se deve ao tratamento de possíveis psicopatologias auferidas no tempo em que o assédio era praticado. Já o dano moral é decorrente puramente da humilhação que atinge a honra objetiva ou subjetiva da vítima, sendo a primeira quando terceiras pessoas presenciam ou tomam conhecimento do ocorrido, fazendo com que a reputação pessoal ou profissional da vítima seja maculada, ou na segunda hipótese quando a pessoa se sente intimamente ofendida, porém sem o conhecimento de terceiros, mantendo uma imagem, ante terceiros, imaculada.
5.1. Da fixação do 'quantum'
O artigo 946 do Código Civil reza que:
“Se a obrigação for indeterminada, e não houver na lei, ou contrato fixando a indenização devida pelo inadimplente, apurar-se-á o valor das perdas e danos na forma que a lei processual determinar”.
Deve-se analisar, no dano material, para que não haja injustiças no valor da indenização não somente o que o indivíduo perdeu, mas também pelo que ele deixou de ganhar.
Sobre isso traz o artigo 402 que:
“Salvo as exceções previstas em lei as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar”.
Feita esta análise outro conceito deve ser trazido à baila, é que, danos patrimoniais segundo Venosa são aquelas que “são suscetíveis de avaliação pecuniária, podendo ser reparado por reposição de dinheiro, denominador comum da indenização” (VENOSA, 2006, p.32)
Nas palavras de Wilson Melo de Silva apud Silvio Rodrigues danos morais são:
lesões sofridas pelo sujeito físico ou pessoa natural de direito em seu patrimônio ideal, entendendo-se por patrimônio ideal, em contraposição a patrimônio material, o conjunto de tudo aquilo que não seja suscetível de valor econômico(RODRIGUES, 2002, P. 189)
Como nos lembra Carlos Roberto Gonçalves, “o problema da quantificação do dano moral tem preocupado o mundo jurídico, em virtude da proliferação de demandas, sem que existam parâmetros seguros para sua quantificação”.(GONÇALVES, 2003, p.569)
Porque o que se mede no dano moral, é o dano psicológico ocorrido, a dor sofrida, coisas imensuráveis.
Então observando o disposto no supracitado artigo 946 do Código Civil, cabe ao juiz, sem nenhum parâmetro pré-fixado, quantificar o valor da indenização.
Concluímos que cada caso deve ser analisado individualmente, não podendo haver uma fórmula ou um valor máximo para sua fixação porque dependendo de quanto a dignidade da pessoa foi atingida é que se poderá mensurar um valor para indenização.
Fonte: http://preparabrasil.uol.com.br/_site/artigos/artigo_default.asp?ID=1973